Um terço dos professores do campo tem formação inadequada
Nas escolas urbanas, quantidade cai para 12%. Para especialistas, garantir formação que valorize a realidade do campo é desafio
Pouco mais de um terço (35%) dos professores das escolas rurais dão aulas sem a formação adequada. Formar esse contingente de 118.736 profissionais é apenas um dos desafios do governo federal, que lançou há 23 dias o Programa Nacional de Educação do Campo (Pronacampo).
Dados do Censo Escolar 2010 mostram que a precariedade da formação dos docentes é mais grave nas séries finais do ensino fundamental e no ensino médio. Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), apenas professores com diploma de licenciaturas podem dar aulas nessa fase. Mas metade dos que atuam no campo não é graduada.
Levantamento feito pela organização Todos pela Educação aponta que 91.380 professores que atuam nessa fase sequer cursaram uma graduação. Outros 3.993 têm diploma, mas não de licenciatura, como recomendado pela lei. Juntos, eles representam 49,9% do total de educadores que lecionam nas turmas finais do ensino fundamental e do ensino médio.
Situação precária no campo: Só 36% dos jovens de 15 a 17 anos no ensino médio
A situação melhora na educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental, mas porque a exigência é menor. A formação mínima exigida legalmente dos profissionais que dão aulas para essas turmas é o diploma de magistério. Ainda assim, 23.363 não cumprem essa determinação (13,3% do total). E apenas 38,2% desses educadores fizeram curso superior.
Escolaridade dos professores na área rural
Levantamento feito pela organização Todos pela Educação a partir dos dados do Censo Escolar mostram que menos da metade dos docentes do campo têm diploma de curso superior (em %)
Foto: Divulgação
“Os dados revelam o tamanho da desigualdade educacional entre o campo e a cidade, que precisamos combater. Por isso, iniciar o Pronacampo pensando na formação de professores já é um passo importante, mas defendemos políticas ainda mais específicas para a área”, afirma Priscila Cruz, diretora-executiva do Todos pela Educação.
O levantamento do Todos pela Educação mostra que, nas escolas urbanas, o número de professores sem curso superior é bem menor. Do total de 1,7 milhão de docentes que trabalham nas cidades, 74% têm diploma de ensino superior. Na área rural, a quantidade cai para 43,8% do total. Nas cidades, 14,8% dos professores das séries finais do fundamental e do ensino médio têm formação inadequada.
Para ela, o programa avança, mas deveria ter ações mais “estruturantes” para as escolas rurais. Priscila ressalta que o papel do professor na educação como determinante. Por isso, ela defende que a formação dos educadores que estão no campo seja uma das prioridades do Pronacampo e a criação de uma carreira mais atraente para quem os que atuam na área rural.
Significado na formação
Nesse sentido, a diretora compartilha da opinião de outros especialistas no tema: as graduações que forem oferecidas a esses profissionais precisam se adequar à realidade da área rural. Se essa não for a estratégia, os planos de mudar a realidade da educação rural tende a fracassar.
Mônica Castagna Molina, professora adjunta da Universidade de Brasília (UnB) que ajudou a instituição a montar uma licenciatura em Educação no Campo, afirma que os professores dessas escolas não podem, em primeiro lugar, ser obrigados a sair do campo para estudar. Além disso, a academia não pode ignorar a bagagem cultural do campo durante a graduação.
“O fundamental é que a estratégia de formação adotada pelo governo seja capaz de garantir o acesso ao conhecimento universalmente produzido, um direito de quem está no campo, e a especificidade local, que valorize a vida desses educadores e a realidade deles. É muito importante que, para ter acesso à educação superior, eles não tenham de sair do campo também. A política não pode desenraizar o sujeito de lá”, ressalta.
Na opinião de Mônica, a estratégia adotada pela UnB pode servir de inspiração para o programa. A organização do currículo do curso destinado somente aos educadores que atuam em escolas rurais prevê etapas em que os universitários vão à universidade e atividades em que a universidade vai até os alunos.
“Os professores não podem ser tirados dessas escolas, assim como elas não podem ser fechadas. E frequentar esse ambiente é importante para que a academia conheça e valorize as dinâmicas próprias do campo”, pondera. A professora critica a quantidade de colégios da área rural fechados nos últimos anos. Segundo o MEC, foram 13,6 mil em cinco anos.
O projeto
A presidenta Dilma Rousseff lançou o Pronacampo no último dia 20 de março. Anunciou investimentos de R$ 1,8 bilhão ao ano em ações que incluem, além da formação dos professores, compra de materiais didáticos específicos para o campo e de automóveis para transporte, reforma de escolas, construção de novos espaços e compra de equipamentos, como computadores.
Não há detalhes sobre como funcionarão esses cursos para os professores das escolas rurais. Mas Mônica defende que a aposta na educação a distância não seja vista como única saída. “A formação de educadores não pode ser feita a distância. Precisamos ajudar esses educadores a entende a importância da escola do campo e seu papel no campo hoje”, afirma.
Fonte: O Dia
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